Congresso discute agricultura familiar no Brasil
Painel apresentou pesquisas da UFMA e UFMS sobre o desenvolvimento de políticas públicas e de assentamentos com base no modelo agrícola
Texto: Serena Veloso
Fotos: Adriana Silva
Pensar o ambiente rural além da perspectiva do setor produtivo, avaliando as necessidades de desenvolvimento de políticas públicas para melhorar as condições de vida de seus moradores e trabalhadores é a proposta do 52º Congresso da Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural (Sober). A edição deste ano, realizada no Centro de Cultura e Eventos Professor Ricardo Bufaiçal da UFG, no Câmpus Samambaia, reuniu palestras, mini-cursos e apresentações de trabalho com professores, representantes sindicais e especialistas da área, entre os dias 27 e 30 de julho.
A programação da manhã desta quarta-feira, 30 de julho, contou, dentre as atividades, com o painel O Reconhecimento e a Importância da Agricultura Familiar no Brasil, coordenado pela professora da Universidade Federal de Campinas (Unicamp) e da Federal de São Carlos, na cidade de Araras, Sônia Maria Pessoa Pereira Bergamasco. Os professores Marcelo Sampaio, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), e Everton Picolotto, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), apresentaram o painel que compõe as atividades comemorativas da Sober do Ano Internacional da Agricultura Familiar.
Tendo como foco os novos desafios enfrentados pela agricultura familiar na atualidade, Sônia Maria Bergamasco destacou o avanço do modelo agrícola nos últimos anos com a criação da Lei 11.326, que estabelece as diretrizes para criação de uma Política Nacional de Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais. No entanto, relembrou que a legislação não abrange outros grupos sociais que integram a realidade do campo, como os indígenas e os quilombolas. “Se essa noção de agricultura familiar serviu para aglutinar e fortalecer cabe indagar até que ponto ela pode encobrir uma heterogeneidade que está emergindo em face a novos conflitos ambientais que afloram no meio rural brasileiro”, alegou.
O fortalecimento dos movimentos sociais a partir do reconhecimento da agricultura familiar como categoria foi um dos assuntos discutidos no painel
Em alguns estados brasileiros, essa evolução das questões políticas e econômicas ligadas à agricultura familiar têm evoluído recentemente, como é o caso do Maranhão. Durante 20 anos o professor Marcelo Sampaio (UFMA) acompanhou o desenvolvimento da agricultura familiar em diversas regiões do estado e relatou a experiência, além de sua pesquisa na área, no livro Terra, Trabalho e Poder, da Editora Annablume. O professor analisou como se deu a ocupação da terra em assentamentos para o desenvolvimento da agricultura no Estado, a partir dos processos históricos de movimentação da população.
Segundo Marcelo, 38% da população do estado está concentrada na zona rural. Dessa população, um grande número integra estabelecimentos com produção da agricultura familiar, que cresceu principalmente entre os anos 1970 e 1995. Apesar de a política de incentivos fiscais ter estimulado a elevação de empresas agropecuárias de grande porte e do processo migratório de famílias em função das secas, os pequenos agricultores conseguiram se estabelecer nas terras com a ajuda de projetos como o Colonização do Maranhão, iniciativa da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) em meados da década de 1960, que traçou estratégias para fazer o manejo do solo e assessorou as famílias na produção e comercialização de produtos. “Depois que a Sudene desarticulou essa experiência de colonização, os agricultores lutaram para se inserir nas políticas de reforma agrária, porque isso dava acesso a um conjunto importante de políticas públicas”, ressaltou.
Ainda assim, atualmente essas famílias encontram desafios como a dificuldade de repassar aos filhos a função de cuidar das terras, o baixo nível de escolaridade e por isso de instruir a população sobre necessidades como questões higiênico sanitárias, e a dificuldade de transferência de tecnologia e assistência técnica nas plantações.
Conquistas políticas dos agricultores
A Agricultura familiar e reconhecimento social foi o tema tratado pelo professor Everton Picolotto (UFSM), que abordou a conquista dos direitos dos agricultores da década de 1960 em diante, com a formação dos sindicatos e, mais tarde, de políticas e projetos centrados na área. De acordo com o professor, muitas das vezes, a agricultura familiar esteve relacionada à subsistência, às pequenas produções e à precariedade de meios de trabalho e produção.
Professor Everton Picolotto, da UFSM, apresentou parte de sua tese de doutorado, em que trata dos avanços das conquistas dos trabalhadores da agricultura familiar
Entretanto, ao longo dos anos a categoria veio conquistando reconhecimento a partir das luta para implantação de sindicatos, tanto de trabalhadores quanto patronais, que abriram caminhos não só para reivindicação de direitos trabalhistas a todos, antes garantido somente com a sindicalização, mas também para proposição de ações, como é o caso da Lei Agrícola e do Programa Nacional de Desenvolvimento da Agricultura Familiar (Pronaf), que direciona políticas específicas para a área. “Quanto à pequena produção, categoria que era vista como atrasada, incompetente, em vias de extinção, com consolidação da categoria agricultura familiar passa a ser vista como moderna, eficiente, produtora de alimentos, sustentável, solidária”, destacou.
Fonte: Ascom UFG
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